Fui querer me alimentar melhor e estou quase virando socialista
Mais e mais, por necessidade familiar, minha vida se baseia em trabalhar. Como parte, talvez a maior, dos resultados desse trabalho não fica comigo, eu tento investir o pouco tempo que me sobra em qualificação, para tentar um emprego que me pague mais, com menos esforço. Virei um contorcionista da produtividade. Não importa o quão apertado eu estou no metrô, eu consigo deslocar o ombro e dobrar a mão para colocar o celular na minha cara e fazer os flashcards do dia; mesmo nos menores tempos de almoço, eu espremo, torço e faço espaço para assistir uma video aula, treinar língua estrangeira ou preparar uma aula particular.
Viver só do retorno dessa poupança, morrendo todo dia de cansaço na esperança de descansar um dia, é um hábito nascido da necessidade. Pensei em transformar isso em algo menos trágico e tentar pensar em investimento em uma dimensão além do dinheiro, para variar. Comer melhor. Um balanço mais suave entre carboidrato e gordura, talvez mais proteína e certamente diminuir o refrigerante.
A nutricionista falou de chia, castanha e azeite, para substituir margarina, óleo ou biscoitos, nas boas gorduras: por grama, é cinco, dez vezes mais caro. Mesma coisa para carboidrato, em que trocar refrigante por suco integral, e farinha de trigo por aveia em flocos pode até melhorar sua saúde, mas não sem te tomar uma fatia do bolso.
Se eu reclamar muito, um economista engravatado, bem alimentado e com um carro espaçoso vai me explicar, com um gráfico de oferta e demanda, que a culpa é minha e, se o mundo não fosse ruim do jeito que é, ele seria muito pior - para alguém, em algum momento, em algum lugar -, então é melhor não fazer nada.
Mas acho que ainda posso ficar puto, sem prejudicar o mercado. Porque o dia todo, em que eu tento produzir em todos lugares, eu preciso pensar no que é melhor para Bruno de amanhã. Porém, quando eu consumo, em qualquer lugar, eu só consigo acessar o produto instantâneo, que vai me açucarar hoje e me adoecer no dia seguinte.
Eu me sinto forçado a ser monge quando é para ganhar dinheiro e limitado a ser criança quando é para aproveitá-lo. Tô ficando doente. Não quero fazer mais nenhuma das duas coisas, independente da necessidade de ambas.